5.12.11

6º Festival de Arte Negra de Belo Horizonte/FAN 2011-2012



Tempo totalmente tomado, nos últimos e nos próximos dias, pelos preparativos para a abertura do 6º Festival de Arte Negra de Belo Horizonte/FAN 2011-2012, que acontecerá nos dias 9, 10 e 11/12, no Cine Santa Tereza, como forma de anunciar os desdobramentos do evento, no período de janeiro a maio de 2012. Integrante do grupo de curadores do FAN em 1995 - ano um -, 2003 e 2005/2006, assisti mais ou menos de longe as edições de 2007 e 2009, certo de que já não tinha o que oferecer à realização do mais importante festival de arte e cultura de extração africana fora da África.

A convite da presidente da Fundação Municipal de Cultura, Thaïs Pimentel, voltei agora para fazer parte, junto com o músico e ator Gil Amâncio, a poeta e ensaísta Leda Martins e o gestor cultural Ibrahima Gaye (leia-se: Casa África), da Comissão de Organização do festival, que, repleto de novidades, caminha finalmente para sua consolidação no calendário cultural de Belo Horizonte. Por ora, é isso. Volto ao assunto nos próximos dias. Informações sobre a programação podem ser obtidas aqui. Será muito bom encontrar vocês por lá.

3.12.11

CARTA ABERTA À SECRETÁRIA DE ESTADO DA CULTURA DE MINAS GERAIS - II

Belo Horizonte, 2 de dezembro de 2011



Excelentíssima Senhora Eliane Parreiras
Secretária de Estado da Cultura de Minas Gerais



Senhora Secretária,


Escrevo-lhe, desta vez, com o fim de declinar do gentil convite que me foi feito pela senhora Solanda Steckelberg – a quem cumprimento –, Presidente da Fundação Clóvis Salgado, para conversarmos, em reunião proposta para o dia 16/12, sobre o episódio que motivou a redação e a publicização da minha Carta Aberta de 30/11.

Apesar de o lamentável episódio que denunciei ter tido lugar no Palácio das Artes, seu alcance diz respeito não apenas àquela instituição, mas ao órgão máximo da cultura no Estado – por ser o Terças Poéticas um projeto que integra o que deve constituir-se, por definição, como uma política pública para a Literatura em Minas Gerais.

Como escritor e cidadão, meu interesse prioritário, neste momento, é discutir não os nomes e as ações pontuais – por mais reprováveis que sejam – de profissionais que se encontram à frente de iniciativas da SEC voltados para a Literatura, mas o modo como a arte da palavra tem sido pensada pela atual gestão, em termos de política pública.

Adianto-lhe que sou um dos muitos escritores mineiros que começam a se mobilizar com o objetivo de discutir questões importantes para o setor, como a notícia – veiculada por jornal da Capital e não desmentida oficialmente –, sobre o não pagamento do Prêmio Governo do Estado aos vencedores da edição 2011 do referido certame.

Penso que poderá se mostrar extremamente proveitoso o aproveitamento, por essa Secretaria, da situação específica denunciada em minha Carta Aberta para um primeiro gesto de aproximação de sua gestão com aqueles que se dedicam profissionalmente à Literatura em Minas. Temos sentido falta de uma atenção especial a este campo que é, desde sempre, um dos sinais mais visíveis – inclusive no âmbito internacional – da excelência artística e cultural de Minas Gerais.

Queremos discutir, além da necessária continuidade do Prêmio Minas, caminhos que levem à consolidação do Suplemento Literário de Minas Gerais, finalmente dotando-o das condições necessárias para cumprir efetivamente o seu papel. Da mesma forma, interessa-nos pensar junto com sua equipe uma melhor forma de inserir a Literatura na programação da Rede Minas e da Rádio Inconfidência, bem como na pauta cotidiana de equipamentos como a Biblioteca Pública Estadual Luiz de Bessa, o Museu Mineiro, o já mencionado Palácio das Artes e outros.

Assim, senhora Secretária, solicito-lhe a fineza de examinar a possibilidade de abrir espaço em sua agenda para receber alguns escritores para apresentação, em detalhes, do pensamento, das realizações e das propostas de sua gestão (em curso ou ainda em fase de projeto) para a Literatura. Neste primeiro encontro poderiam ser definidas as bases para a relização, no próximo ano, de um grande Fórum sobre Políticas Públicas Para a Literatura aberto à participação de representantes de todo o Brasil, numa iniciativa – pioneira – que, asseguro-lhe, será muito bem recebida por todos, dada a secundarização a que historicamente são submetidos os profissionais da escrita no País.

Sem mais para o momento, coloco-me à sua disposição e subscrevo-me.

Cordialmente,

Ricardo Aleixo

30.11.11

CARTA ABERTA À SECRETÁRIA DE ESTADO DA CULTURA DE MINAS GERAIS



Belo Horizonte, 30 de novembro de 2011


À Excelentíssima Senhora Eliane Parreiras

Secretária de Estado da Cultura


Prezada Eliane Parreiras,


Cumprimentando-a cordialmente, solicito sua atenção para o relato de um grave episódio ocorrido na noite de ontem, na Sala do Coral Lírico do Palácio das Artes, onde se realizou mais uma edição do projeto Terças Poéticas. Junto com minha companheira, a poeta Mariana Botelho, que participou do referido projeto no dia 27 de agosto do ano em curso, estive lá a convite dos responsáveis pelo programa da noite, os poetas Álvaro Andrade Garcia e Luciana Tonelli.

Encerrado o recital, o curador do evento, senhor Wilmar Silva, abordou Mariana com o fim de lhe apresentar justificativas para o não pagamento, até o presente, do pró-labore referente à participação dela no Terças Poéticas. Segundo Mariana – que no momento estava acompanhada pela poeta Thais Guimarães, testemunha de todo o ocorrido –, o senhor Silva ia mostrando-se cada vez mais alterado à medida que suas débeis explicações para o considerável atraso no pagamento de um trabalho realizado há exatos três meses eram refutadas com a reiterada lembrança dos muitas tentativas de contato via email e celular, realizadas desde setembro, às quais o curador do evento deixara de responder.

Incapaz de responder com objetividade à observação de que, de acordo com a funcionária do setorfinanceiro do Palácio das Artes, o nome de Mariana Botelho sequer constava da lista que lhe fora enviada pelo curador do Terças Poéticas, o senhor Silva passou a desafiar a poeta a denunciá-lo junto à Secretaria de Estado da Cultura. E o fez, não tenho dúvidas, por ter ouvido da poeta a frase: “Se você tem problemas com o Ricardo Aleixo, resolva isso com ele, não comigo, que não me mudei do interior [da cidade de Padre Paraíso] para Belo Horizonte para herdar desafetos”.

Já na saída da sala do Coral Lírico, fui informado do episódio e subi de volta as escadas, com o objetivo de exigir do senhor Silva que tratasse Mariana Botelho com respeito, e que não transferisse para ela o ódio que parece sentir por mim (desde que escrevi em meu blog o post que pode ser lido neste link: http://jaguadarte.zip.net/arch2006-09-24_2006-09-30.html). Impedido por sabe-se lá quais motivos de ouvir o meu desabafo – feito diante de testemunhas – com a serenidade a que seu cargo o obrigaria, o senhor Silva tentou investir fisicamente contra mim, tendo sido impedido pela pronta e firme ação do poeta Bruno Brum. Quando lhe dei as costas para descer as escadas, o cada vez mais destemperado senhor lançou uma cusparada em minha direção, a qual, mesmo não tendo me atingido, confirmou, para mim e para as demais pessoas que presenciaram a deplorável cena, que tamanhas arrogância e grosseria são incompatíveis com a prática de um profissional da área cultural.

Escrevo-lhe, portanto, prezada Eliane Parreiras, para torná-la ciente de que fui tratado como um moleque por um colaborador de sua gestão (que, já não bastasse a apropriação indevida de um projeto e de um espaço da administração pública estadual para fins de autopromoção, ignora totalmente a compostura exigida pelo cargo que ocupa). Estou certo de que a senhora saberá honrar tanto o papel que lhe cabe como gestora pública quanto a condição privilegiada da literatura produzida em Minas Gerais no conjunto da cultura brasileira e imporá novo rumo a um projeto – o Terças Poéticas – conduzido, até aqui, de forma provinciana, amadora, imperita, desrespeitosa e, acima de tudo, carente de transparência.

Informo-lhe, para finalizar, que, dada a gravidade da situação acima descrita, e para tentar impedir ou, quando menos, relativizar a ação dos intrigantes de sempre, optei por dar ampla divulgação a esta correspondência. Colocando-me à sua disposição para quaisquer esclarecimentos que se façam necessários, envio-lhe meu

abraço cordial.


Ricardo Aleixo - poeta, editor e integrante da Comissão de Organização do 6º Festival de Arte Negra de Belo Horizonte/FAN 2011-2012

28.11.11

FESTA


Lançado em setembro do ano passado, meu livro MODELOS VIVOS, publicado pela Editora Crisálida (de Belo Horizonte), ficou entre os 10 finalistas de dois dos mais importantes prêmios literários do País, o Jabuti e o Portugal Telecom.

Para comemorar o duplo feito, eu volto a apresentar, no próximo dia 3/12, sábado, às 21h, na Casa África, a performance MÚSICA PARA MODELOS VIVOS MOVIDOS A MOEDAS (poesia + música + ruidagem + vídeo + corpografia +).

Junto com poemas de MODELOS VIVOS musicados por mim, vou mostrar também algumas das canções que fiz em parceria com nomes como Chico Lobo, Mauricio Tizumba e o senegalês Zal Idrissa Sissoko, que fará uma participação especial tocando kora.

Serei acompanhado, nas canções, pelo violonista, guitarrista e arranjador Alvimar Liberato, meu parceiro desde a década de 1980. Na parte solo da performance, em que trabalho as peças mais abertamente experimentais, vou produzir a ruidagem por meio do uso de pedais que me permitem ampliar as possibilidades musicais da voz falada, cantofalada, gritada e sussurrada.

Em tempo: MODELOS VIVOS poderá ser adquirido pelo preço promocional de R$ 25,00. Será cobrado um couvert artístico de R$ 7,00. A Casa África fica na rua Tulipa, 215, bairro Esplanada. Reservas de mesas e maiores informações pelo telefone 36534244.

30.10.11

Salve, Jorge!

Das coisas em que trabalho atualmente, uma que me dá muita, mas muita alegria mesmo é um vídeo-documentário sobre a obra do escultor Jorge dos Anjos. Bancado por nós dois (minha mãe dizia: "Quem quer, faz. Quem não quer, manda ou pede"), o novo trampo, tal como o videopoema abaixo, traz uma conversa - com e sem palavras - entre dois amigos que, desde 1988, admiram-se e apoiam-se mutuamente, confirmam-se como irmãos de fé e, sobretudo, riem muito a cada vez que se falam ao telefone ou de corpo presente. Salve, Jorge! PS(1): O texto que escrevi para o catálogo da mostra A ferro e fogo, em 2009, quando o vídeo homônimo foi exibido pela primeira vez, pode ser lido aqui. PS(2): O poema e a voz que o diz, no vídeo de 2009, são do próprio Jorge.

28.10.11

OBRACABADA

Numa encruzilhada de Madri, Ricardo Aleixo & Marcelo Sahea, integrantes do recém-criado grupo OBRACABADA – aqui, num frame de uma das muitos videoperformances que realizaram por lá. Do cardápio das aprontações intersígnicas do grupo, que será lançado oficialmente no dia 7 de dezembro, via web, fazem parte os seguintes tópicos: poesia falada cantada gritada sussurada cantofalada + arte sonora + arte vestual + cinema de poesia + música extrema + radiovideoarte + performance + artemídia + macumba para dadafrofuturistas + intervenção urbana + design gráfico + agricultura celeste + desobediência + resistência ativa +

26.10.11

Podia ter sido um desastre, mas: PESADO DEMAIS PARA A VENTANIA



Minha apresentação em Madri, no último sábado, dentro da programação do festival 2011 poetas por km2, foi precedida pela do poeta e performer português Fernando Aguiar. Conhecemo-nos em Diamantina, há 5 anos, quando participamos do Festival de Inverno da UFMG. Não nos tornamos amigos ao longo desses anos, mas fiquei contente ao revê-lo em Madri. Conversamos brevemente sobre issos e aquilos – aí incluída a ordem das nossas apresentações no palco: cada um pensava que seria o primeiro a performar.

Em geral, tal questão só me ocupa a cabeça por exigir diferentes tipos de resposta a problemas de ordem técnica, uma vez que, em termos estéticos, e mesmo quanto às solicitações do ego, pouco se me dá saber quem vem antes ou depois de mim. Apesar de, assumidamente, preferir as situações em que performarei num espaço em que não haverá nenhuma outra apresentação – nem antes nem depois, para evitar a nefasta correria –, vi como um saudável desafio a necessidade de montar e desmontar tudo em escassos minutos (10 em média, para cada etapa), eu que costumo gastar, só na montagem, cerca de três horas.

Eu estava tranquilo também porque já havia tido alguns contatos – por escrito e pessoalmente, assim que cheguei a Madri -, com o coordenador técnico do festival, o gente-boa-toda-vida Jorge Alvarez, que baila comigo (vide o vídeo, alguns posts abaixo) numa improvisação vocal que fiz com base no meu poema “Linhas”. Daí o sentimento de paz a que aludi num dos posts que disparei no sábado à tarde, algumas horas antes de subir ao palco: além de ter feito uma magnífica sessão de pruebas de sonidos + vídeo + luz, alterei significamente o roteiro no quarto do hotel, devido à impossibilidade de renderizar a tempo os novos vídeos em que vim trabalhando nas semanas que precederam a viagem, os quais apresentavam as versões em espanhol de poemas meus vertidos por Adolfo Montejo Navas, Cristian de Napoli, Fernando Pérez e Teresa Arijón.

Decidi usar os dois projetores para mostrar vídeos que criei para utilização em outras performances, concentrei-me na tarefa mais delicada do dia: interferir no lindo livro que Mariana Botelho criou especialmente para a estreia da performance Pesado demais para a ventania, grafando com caneta preta, ao lado dos poemas em português, suas versões na língua/lengua de Lorca.

Detesto admitir que fui capaz de erro tão primário, mas por já ter visto Fernando Aguiar em cena eu deveria ter perguntado a ele – que de fato me precederia no palco – se constaria de seu roteiro a série de “sonetos-ações” que o vi executar em Diamantina. Foi, assim, com total surpresa, já no limite com a estupefação, que vi o performer português quebrar copos de cristal e pratos de louça no mesmo palco em que, daí a poucos minutos, eu teria que performar.

Do roteiro que concebi inicialmente fazia parte uma longa e lenta sequencia de movimentos com o poemanto. No chão. Cair, rolar de um lado a outro, passar em passos diminutos à frente do projetor, tornar a cair e a rolar pelo chão, girar sobre meu próprio eixo e de novo cair e rolar e me levantar e voltar a cair o quanto me desse na veneta.

Marcelo Sahea, a meu lado, ficou logo tenso com o que víamos, antevendo o desastre que se desenhava, o que me permitiu lançar mão de uma calma tão intensa que pensei, naquele momento único, no sentido profundo da palavra paz que eu afirmara sentir horas atrás. Esperei que limpassem o chão do palco, enquanto reorganizava mentalmente o passo a passo da performance e entre em cena disposto a atuar como se nada, nenhum problema existisse naquele momento.

Consegui, creio, evitar mal maior, mas levei um bom tempo até entender que Sahea tinha razão ao me cumprimentar efusivamente, no final, certo de que eu fizera uma boa performance ("emocionante, foi o que ele disse). Concordo com ele porque finalmente entendi o que fiz: tive que juntar ao “saber fazer” o “saber ser” – demanda dupla que, no dizer de um dos pais fundadores das poéticas da voz, o suíço Paul Zumthor (1915-1995), define o aqui agora irrepetível da performance. Em Madri, na noite de 22 de outubro, diante de dezenas de pessoas para as quais o português-brasileiro soa como iorubá arcaiaco, me vi obrigado a, em pouquíssimo tempo, para citar uma bela cantiga antiga de Gilberto Gil, “aprender a só ser”.

8.10.11

Um presente do mestre Nei Lopes

FINA POÉTICA EM CAPA DURA

(quasipoema oito meses depois)


Fora de sacanagem!

A frase introdutora

De eu molecote

Me chega na entrega

Dos dois postais pacotes:

Um, Salgado Maranhão

O outro um Ricardo Aleixo.


Que doce

É esse salgado

Sem sombra de emaranhado.

Que absoluto nexo

É esse recado

Que liga o léxico

E o contexto se[ro]mântico

De cada um desses

Dois pacotes convites ao convescote

A mim e ao meu [con]texto?

Mineiro o emaranhado


Me disponho

Sem tentar decifrar

O que me traz essa mensagem

Postal

Contexto duplo

Gêmeo, mabaço:

Ibeji brinca

e reconduz meu passo.


Sem sacanagem:

Sábado, 25 de setembro

Assino, recebo, referendo

Dois livraços abraços

Aleixo, o salobro

Que pesca o peixe

E o mostra no anzol paterno.

E o doce Salgado

Que abole o emaranhado branco

Quase eterno

Da escrita.


Salgado

Negro olímpico!

Aleixo escrita zero máquina!

A poesia batia de novo

Em dose dupla

De leve

No meu fígado

No meu sábado.

Fina poética negra em capa dura.

Vinte e cinco de setembro

Quase Ibêji.

3.10.11

Em resenha inédita, Ângelo Oswaldo fala sobre "Modelos vivos"

A poesia de Ricardo Aleixo

Ângelo Oswaldo*

Em “Modelos Vivos”, Ricardo Aleixo reúne um conjunto significativo de poemas, depois de largo momento voltado para outras formas de expressão poética, tais como performances, vídeos e canções. É um belo livro. Oferece destacada programação visual dirigida pelo autor, sendo enriquecido pela diversidade da produção que enfeixa.

Com a publicação, o poeta registra os seus cinquent’anos, não em celebração jubilar, mas para reiterar o compromisso do primeiro olhar, o desejo de querer ver, por sobre a visão deficiente, algo que valha a pena, para além da falta de perspectivas que percebe como tônica do nosso tempo.

Ricardo Aleixo vem de 1960 e é poeta que sintetiza, de modo original e referente, as inquietações, as rupturas e as angústias que convulsionaram o mundo neste meio século de transformações. Sua obra atinge pontos sempre mais altos. Se a visão está afetada, como a de Camões & Bob Creeley & Joan Brossa, ele enxerga aquilo que só o poeta vê e a poesia alcança, por cima do glaucomatoso de Glauco & Borges, numa respiração. São poderosas as suas antenas, e é com elas que se faz o poeta, segundo Ezra Pound. Como o anjo de um poema do livro, o poeta aprende a se ver pelo avesso.

As palavras “são peles de silêncios habitáveis”. Ricardo Aleixo as veste, no seu “poemanto”, qual um parangolé de Hélio Oiticica (obra para vestir) ou como passos de Merce Cunningham (obra para dançar) ou o rito dos Eguns (obra para reviver). A palavra é viva e é vivida pelo poeta, que a escreve-inscreve com seu corpo e com ela o cobre, volatiza o andar, sonoriza o espaço, toca o tempo. O “poemanto” é imantação da poesia no corpo do poeta.

Nessa corpografia, ao pé da letra de Artur Bispo do Rosário, “andando em círculos” (porque “estamos mesmo é andando em círculos”), o poeta usa o seu manto como o toureiro a capa, em passos encadeados como numa fuga, ou o agita num batuque, revira-o em volteio de volutas em altares barrocos, ginga-o na reviravolta da capoeira ou mergulha na constelação de Mallarmé, soltando as palavras no espaço para reinventar o poema ao acaso de cada lance de corpo.

Inovadora e inventiva, instigante e incisiva, a poesia de Ricardo Aleixo apresenta uma linguagem própria, que não se restringe ou se reduz. É sempre múltipla e entregue a pesquisas sobre novas possibilidades. No final do poema que dá o título do livro, está a questão: “...Pergunto-me, como se perguntava Heinrich/ Kleist sobre os manipuladores de marionetes que tanto// encantavam o amigo a quem devia o despertar do interesse/ pelos mistérios daquela arte de rua, se os passantes-// pagantes conhecem os mecanismos que movem os modelos/ vivos; se possuem pelo menos uma ideia do belo na dança”. Têm, da mesma forma, os leitores que passam pelas livrarias alguma ideia do valor da obra de Ricardo Aleixo? É preciso urgência no conhecimento de um modelo vivo do poeta do nosso tempo.

* Crítico de arte, escritor e prefeito de Ouro Preto

22.9.11

Como diz a letra de Antonio Risério,

"eu vi [estou vendo] um Jabuti comendo jabuticaba".

19.9.11

Música para modelos vivos movidos a moedas

A performance Música para modelos vivos movidos a moedas, na versão que só será mostrada nesta quarta-feira, 21 de setembro, se metamorfoseará em: 1) celebração do meu aniversário (51 anos + uma semana) e da classificação do Modelos vivos para a fase final do Prêmio Portugal Telecom; 2) banca de poeta-camelô, para venda do livro acima citado ao preço promocional de R$ 25,00; 3) show de calouros, que premiará com um exemplar do Modelos vivos cada uma das três melhores leituras em voz alta de um poema do livro. PS: Nesta quinta-feira, enquanto descanso da performance, volto a cuidar do assunto de que trato no post abaixo.

18.9.11

Com compreensão é mais caro

Alguém já disse, a respeito do lugar instável ocupado pelos artistas no mundo do trabalho, em países, como o Brasil, que tal situação refletiria um ponto de vista machista, o qual identifica a arte como “coisa de maricas”. Simples assim. Quem já preencheu um único formulário de alguma lei de incentivo sabe bem do que estou falando. O artista, para obter a espiga de milho (de milhões, para uns poucos) que lhe permita desenvolver o seu trabalho, justifica o injustificável, faz promessas impossíveis de cumprir, prova por a + b q sua arte é “útil” e “necessária”, conta e reconta centavos. Tudo para mostrar que sua ocupação é séria, porquanto desenvolvida nos moldes do que dele esperam o governo, os diretores de marketing, a mídia, as criancinhas pobres e todos os excluídos deste mundo grande sem porteira.

Também já foi vítima do machismo anti-artistas quem por acaso passou pela situação por que passo agora: dias depois de encerrado o Festival de Inverno de Ouro Preto e Mariana, onde ministrei uma oficina, recebi email da coordenação do evento com uma pletora de documentos que eu deveria enviar para confecção do contrato. Não bastasse a solicitação dos documentos ter sido feita quando eu já me encontrava às voltas com outras atividades, o contrato continha uma série de pontos que eu gostaria de discutir, mas que, para receber logo e dar por encerrado o assunto, julguei mais pertinente ignorar. Santa ignorância, Batman! Descobri, dias atrás, que a verba da qual sairá o meu pagamento foi depositada na conta do Festival, mas ainda não pode ser movimentada, por se tratar de recurso advindo de lei de incentivo.

O problema é que ninguém me avisou que eu teria que trabalhar nessas condições: “fazendo fiado” para uma instituição pública. Parte-se da premissa de que artistas, seres “sensíveis”, “iluminados”, não devem ser incomodados com questões burocráticas – ou porque não se importam mesmo com elas, ou porque não teriam condições de compreender os meandros e meonardos da vida (burocrática) como ela é. Fui lesado, e é por isso que resolvi tornar público o problema. Escrevo para o setor financeiro do Festival e tudo o que fazem é me pedir “um pouco mais de compreensão”. Não compreendo, já que não gosto de ser tratado como moleque. Minha família, meus credores e meu desejo de viver dignamente também não compreendem. Meu advogado me disse para tentar compreender pelo menos até a próxima terça-feira, dia 20. Disse a ele que vou tentar. [A imagem acima é um hit da arte experimental brasileira: Zero cruzeiro, de Cildo Meireles].

12.9.11

Na França

A dois dias da minha chegada aos 51 anos, o correio me trouxe um presente vindo da França: um exemplar da edição nº 204 da revista Action Poétique, que traz, entre outras atrações, uma seção intitulada “Poètes du Brésil aujourd’hui”, de que participo, com três poemas. A organização, a nota introdutória e as traduções ficaram a cargo de Inês Oseki-Dépré. Gostei imenso do modo como meu poema “Máquina zero” - do livro homônimo, de 2004 - se saiu na língua de Mallarmé.


MACHINE ZÉRO



Quatrième journé: j’enteds q

ue ce dont j’ai besoin, si je q


uête vraiment l’occasion de continuer à d

éambuler avec un certain succès d


ans une ville (deux) comme Berlin, ce sont

des chaussures au large souffle. Je marche (je pense t


andis que je marche), perméable à t

out: au froid coupant, aux enfants t


urcs et leur commerce informel de b

ric à brac usagé, à la b


eauté sans but de l’adolescent qui (ses longues p

attes écartées sur une p


rosaïque selle de bicyclette) c

hevauche le c


ommencement de l’après-midi, aux graffitis qui “d

onneiraient de belles photos”, à la Topographie d


e la Terreur, aux ruines, au r

asta qui me salue (“R


asta!”) sur La Wilhelmstrasse, aux m

iettes du Mur sur la vitrine du petit m


agasin, au j

aune-zoom du métro j


aillisiant dans le virage a

vant le théatre, à


l’Histoire,

24.8.11

Minha agenda até outubro

: Leitura de poemas e entrevista, junto com Mariana Botelho, no projeto Sarau da Casa, (27/8, sábado, 19h, Casa das Rosas, SP)

: Participação, como diretor artístico e sound designer, no recital O silêncio tange o sino, de Mariana Botelho (30/8, terça-feira, Jardins Internos do Palácio das Artes, BH, dentro da programação do projeto Terças Poéticas)

: Performance Música para modelos vivos movidos a moedas no projeto Quarta Mix (21/9, quarta-feira, 18h30, SESC Palladium)

: Participação, como diretor artístico e sound designer, no recital (Prova de corte) da poeta Thais Guimarães (27/9, terça-feira, 18h30, Jardins Internos do Palácio das Artes, BH, dentro da programação do projeto Terças Poéticas)

: Performance Música para modelos vivos movidos a moedas no projeto Europalia (11/10, terça-feira, horário a confirmar, Bruxelas/Bélgica)

: Performance Pesado demais para a ventania, no projeto Poetas por 200 km2 Festival (22/10, sábado, 21h30, Madri/Espanha)

[A foto acima, de Alexandro Trindade, mostra um dos momentos iniciais da performance A ferro e fogo, que fiz em Curitiba, em maio deste ano, junto com Jorge dos Anjos, “general da banda” e meu grande irmão desde sempre]