31.12.10

Compor

Ser poeta não foi um caminho que escolhi – não é caminho que se escolhe, eu diria. Poeta é como que um lugar de onde se vê o mundo, não uma profissão.

Escolhi, desde o começo, isto sim, foi andar por uma trilha tão entrecortada por outras trilhas, que só posso, mesmo, me definir como um compositor. De poemas, inclusive. E, cada vez mais, de canções e peças que, a ouvidos mais sensatos, não passam de barulhos.

E não estou sozinho nesse esforço de autodefinição. Lembro-me de Livio Tragtenberg e Paulinho Moska dizerem praticamente a mesma coisa, em contextos e épocas diferentes.

Tragtenberg, numa entrevista de 2005, disse: “A coisa melhor no mundo é você chegar num hotel, quando dão aquele negocinho (ficha cadastral) para preencher... Ocupação: compositor, isso é uma conquista. Quer dizer: você viver de música, viver da sua composição, você se colocar como compositor, e eu gosto dessa ideia do compositor, porque eu não sou só um compositor de música, hoje a gente vai ver... Vocês vão ver: eu sou um compositor de... ideias!”.

Já o Moska, numa entrevista que saiu este ano aqui em Belo Horizonte, disse: “Sou um compositor. No sentido de que um compositor é alguém que junta coisas. Componho coisas, não gosto da ideia de especialização. E cada vez mais caminho nessa direção.”

Não posso deixar de dizer que, neste (tão intenso) 2010 que hoje se encerra, “compor coisas” rivalizou, no meu dia a dia, com a demanda cada vez mais crescente de compor a mim mesmo, de me re/compor como sujeito. Creio que não fiz feio. Agora cinquentenário, consegui trocar a hipótese tenebrosa – esboçada no começo do ano – de uma sobrevida por um tipo de vida que, para merecer o nome que leva, exige ser vivida plenamente.

Daí a importância de encontrar, entre as coisas da minha mãe, a recordação da primeira “distinção” que recebi na vida, aos 8 anos de idade: um diploma de honra. Tê-lo conquistado por conta de uma “composição” (nome dado à redação, na época) que fiz ainda menino só aumenta minha convicção de que sou, desde sempre, um compositor.

Nos vemos em 2011! Ao final desta frase ela se transformará num grande abraço

do

Ricardo

12.12.10

Composição como explicação

“Ninguém está à frente de seu tempo, é só que a variedade particular de criar o seu tempo é aquela que seus contemporâneos que também estão criando seu próprio tempo se recusam a aceitar. E se recusam a aceitar por uma razão muito simples,que é a de não terem motivo algum para aceitar. Eles próprios isto é todo mundo em seu entrar na composição moderna e eles entram mesmo, se eles não entram não estão propriamente nela estão fora dela e então entram; mas dentro do que pode ser chamado esforços não-competitivos onde se você não está dentro nada se perdeu exceto alguma coisa exceto o que não é tido, existem naturalmente todas as recusas, e as coisas recusadas só são importantes se inesperadamente acontecer de alguém precisar delas.” [O fragmento acima integra uma palestra proferida por Gertrude Stein em Cambridge e Oxford, na década de 1920. Posteriormente inserido no livro What Are Masterpieces – O Que São Obras Primas, o texto, vertido para o português por Andrea Mateus, foi publicado na revista Modo de Usar & Co. nº 2, em 2009]

5.12.10

Um dos SONETOS A ORFEU, de Rainer Maria Rilke, em tradução de José Paulo Paes

I:3



Um deus o pode. Mas, diz-me, poderia um

homem acompanhá-lo na lira acanhada?

Sua mente é discórdia e nas encruzilhadas

do coração Apolo não tem templo algum.


O canto, como o ensinas, não é o querer

nem busca do que quer que seja de atingível.

Cantar é existir. Para o deus, tão factível.

Mas nós, quando é que somos? Quando ao nosso ser


dará ele de volta a terra e as estrelas?

Não é o que amas, jovem, mesmo que forçasse

a voz em tua boca. Aprende a esquecê-las,


tais canções. Elas passam, frutos do momento.

O cantar em verdade de outro sopro faz-se.

Um sopro de nada. Um alento em Deus. Um vento.

3.12.10

EM ALTO E BOM SOM, NOSSA RESISTÊNCIA ATIVA

CONVOCATÓRIA

O Centro de Referência Hip Hop Brasil, a Família de Rua e o Coletivo Nospegaefaz convidam militantes do hip hop, ativistas dos movimentos sociais e populares, artistas, representantes de organizações da sociedade civil e amigos a participarem do lançamento da campanha DESARME A VIOLÊNCIA EM VOCÊ, nesta sexta-feira, dia 3 de dezembro, a partir das 20h, no Duelo de MC’s, em frente à Serraria Souza Pinto.

Esta ação presta solidariedade irrestrita ao rapper e arte-educador Hudson Carlos de Oliveira, o Ice Band, que foi covardemente agredido domingo passado, em crime de motivação racista e de intolerância, em frente ao monumento de homenagem a Zumbi dos Palmares, no bairro Santa Efigênia.

A partir de agora, todas as sextas-feiras um muro da cidade receberá a intervenção de um artista plástico de periferia, até que o processo judicial se encerre com a condenação dos culpados por este ato de barbárie que fere a dignidade humana e os direitos civis de todos os brasileiros. Em defesa da vida, da liberdade e da justiça, participe.

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Nota: Há muito acompanho a trajetória vitoriosa e exemplar de Hudson, colaborador da 6ª edição da revista RODA – Arte e cultura do Atlântico Negro. Ele e Janaina, sua mulher, são meus amigos. Quem quiser saber mais sobre esse triste episódio de visível conotação racista, recomendo a leitura das matérias publicadas pelos jornais O Tempo e Estado de Minas. Recomendo, ainda, e especialmente, a crônica da editora do caderno Magazine, de O Tempo, Silvana Mascagna, que, espero, ajudará os agressores de Hudson a entenderem que, ao contrário dos incontáveis negros anônimos linchados diariamente no Brasil, não raro com a conivência/participação de policiais e o silêncio da mídia, Hudson conta com MUITOS amigos dispostos a fazer barulho junto com ele, para que a justiça prevaleça. [Ricardo Aleixo]

1.12.10

Quer ouvir Paulo Leminski vociferando (a palavra é mais do que adequada) contra tudo

e contra todos, numa entrevista conduzida pelo grande crítico paranaense Aramis Millarch? É só dar um clique aqui.